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quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Esqueça os aliens, é hora de conhecer os intraterrestres

Eles também são aliens, aparecendo em formas bizarras e intrigando os cientistas. Mas, ao invés de residirem no espaço, esses alienígenas habitam um reino subterrâneo escuro, circulando a energia do interior da Terra.

A maioria dos intraterrestres vive embaixo do fundo oceânico, em uma biosfera invisível que é um amontoado de estranhos organismos.

Muitos fazem suas casas nas dezenas de metros de lama abaixo do assoalho dos oceanos; outros vão ainda mais para baixo, em rachaduras de rochas sólidas, centenas de metros mais a fundo.

Os cientistas estão apenas começando a investigar esse mundo subaquático. No meio do Pacífico Sul, especialistas descobriram como bactérias vivem em sedimentos pobres em nutrientes e sufocantes.

Outros pesquisadores viram micróbios colonizarem um buraco a 280 metros do fundo oceânico. E perto da montanha submersa que marca o meio do oceânico Atlântico, cientistas encontraram organismos que não se parecem com nenhum residente marinho conhecido.

Esses acontecimentos estão ajudando os biólogos a criar uma imagem do ecossistema do mundo do “fundo”.

Entender como isso surgiu pode levar a uma melhor compreensão da origem da vida na Terra. Um dia, os intraterrestres podem até ensinar mais sobre os extraterrestres, já que são exemplos de vida em locais extremos.

Deserto oceânico


Considerando que os oceanos cobrem a maior parte do planeta, é insano saber tudo o que vive na lama e nas rochas deles. “É com certeza o habitat com o maior potencial do planeta”, afirma o biólogo Beth Orcutt.

Alguns estimam que pelo menos um terço da biomassa do planeta está enterrada no chão oceânico. Muitas dessas bactérias e micróbios sobrevivem de comida que vem de cima, como as sobras de plâncton.

Esses micróbios conseguem existir onde não seria possível. No meio do Pacífico Sul, por exemplo, está um vórtice onde a água circula em um turbilhão gigante, do tamanho de duas Américas do Norte.

Como esse fenômeno acontece muito longe de qualquer terra firme – onde existem nutrientes para que os plânctons cresçam – o local é um verdadeiro deserto oceânico.

Em alguns locais desse ponto, o assoalho oceânico cresce oito centímetros por milhão de anos. Isso significa que se você quiser plantar algo com uma raiz de 16 centímetros, estará cavando em uma lama com dois milhões de anos.

Essas zonas de baixa produtividade, nos centros dos oceanos, são muito mais comuns do que as ricas em nutrientes, nas costas, mas os cientistas não costumam visitá-las por que são de difícil acesso.

Em 2010, D’Hondt liderou um grupo até o vórtice e coletou amostras do fundo. “Nós queríamos ver como era a vida sedimentar da parte mais morta do oceano”, afirma.

Entre outras coisas, os cientistas descobriram como os micróbios da lama “se viram”. Em outras áreas do oceano, onde mais nutrientes caem no assoalho, o oxigênio está presente até um ou dois centímetros para dentro da lama.

Mas no vórtice, a equipe de D’Hondt percebeu que o oxigênio penetrava até 80 metros nos sedimentos. Para os cientistas, isso sugere que os micróbios respiram muito devagar, usando pouco oxigênio.

“Isso quebra algumas expectativas padrões, mas até estarmos lá e perfurarmos, ninguém sabia”, disse.

Outra possibilidade é que os micróbios tenham outra fonte separada de energia: radioatividade natural. Alguns elementos, presentes na lama e em rochas, liberam radioatividade que quebra o H2O em hidrogênio e oxigênio.

Os microrganismos podem então consumir esses elementos, um fonte quase inesgotável. “Essa é a interpretação mais exótica, que temos um ecossistema vivendo de radioatividade natural que quebra as moléculas de água”, comenta.

Acesso fácil


A milhares de quilômetros do vórtice, outros cientistas estão explorando um local muito diferente, na cordilheira de Juan de Fuca – uma montanha submersa que se encontra na convergência de muitas placas tectônicas.

Juan de Fuca fica perto da costa do estado americano de Washington, recebendo muitos nutrientes e sendo de fácil acesso.

Como resultado, essa área é uma das mais analisadas. Uma rede de observatórios monitora quase todo o assoalho do oceano.

“Nós podemos fazer experimentos ativos lá que não são possíveis em nenhum outro local”, afirma Andrew Fisher, que ajudou a montar grande parte dos instrumentos.

Muitas dessas estações são observatórios conhecidos como CORKs, que são essencialmente buracos bem fundos no chão oceânico fechados no topo.

Os pesquisadores colocam instrumentos de observação dentro dessas crateras, e retornam alguns anos depois para retirá-los. Os dados coletados podem revelar organismos, modos de vida e mudanças populacionais.

Os CORKs são tecnicamente complicados de serem instalados, mas as descobertas podem ser fantásticas. Em um local de Juan de Fuca, em 2004, os pesquisadores encontraram rochas com caules tortos que pareciam uma cobertura de ferrugem.

Acontece que o CORK não havia sido fechado corretamente, e bactérias oxidantes entraram junto com a água.

Essas bactérias inicialmente colonizaram o buraco e fizeram seus caules, se alimentando das condições boas. Mas com o tempo, o buraco foi esquentando devido ao calor vulcânico do fundo. O fluxo de água foi revertido, jorrando para fora do buraco.

A bactéria “do ferro” morreu, dando lugar a outros tipos de organismos: bactérias conhecidas como fermicutes, encontrando em ambientes similares, como o fundo do oceano Ártico.

As pesquisas em Juan de Fuca também ajudam a entender como a água flui no oceano, indicando os melhores lugares para encontrar micróbios.

As pessoas costumam pensar que a água fica inerte no fundo do mar, mas na verdade ela se move entre as rochas subaquáticas – circulando o equivalente a todo o volume oceânico a cada 500 mil anos.

Em Juan de Fuca, Fisher e seus colegas encontraram dois vulcões subaquáticos, a uma distância de 50 quilômetros entre um e outro, o que ajuda a explicar como esse grande movimento acontece.

“Esse é o primeiro lugar no assoalho oceânico onde os pesquisadores conseguiram apontar o dedo no mapa e dizer ‘a água entra aqui e sai aqui’”, comenta Fisher.

Os dois vulcões estão arranjados em uma linha norte-sul que tende a controlar a maior parte da atividade subaquática em Juan de Fuca.

Grande parte das rachaduras na crosta também vai do norte para o sul, fazendo dessa a direção provável dos micróbios.

Essas falhas servem como uma espécie de estrada para os microrganismos, carregados pela água. Cientistas que procuram por seres microscópicos no fundo do oceano devem focar essas áreas.

Nadando em lagos


Muito além de ser monolítico, o solo oceânico apresenta uma série de ambientes diferentes. Um ponto novo, muito diferente de Juan de Fuca ou o vórtice do Pacífico, fica no meio do Atlântico: o Lago Norte. Geólogos vêm estudando esse local desde os anos 70, mas agora os microbiólogos também estão lá.

O “lago” é uma pilha de lama subaquática, isolada no meio de altas montanhas. Ele fica a cerca de cinco quilômetros de onde a crosta oceânica está nascendo; toda essa atividade geológica violenta força a água por entre a lama e as rochas até o oceano superior.

Comparada a de Juan de Fuca, a água no Lago Norte é muito mais fria – cerca de 10 graus Celsius, mas flui muito mais rápido. “A natureza encontra um equilíbrio entre temperatura e movimento”, comenta Fisher.

Ele e a equipe, liderados por Katrina Edwards, passaram 10 semanas no lago. Eles instalaram dois novos CORKs, até 330 metros no fundo, e conseguiram analisar possíveis micróbios.

Eles também colocaram pedaços de rocha dento dos buracos para analisá-los alguns anos depois.

Por enquanto, o trabalho é dos microbiólogos de estudar o que já foi pego. Eles estão apenas começando as análises, mas já suspeitam de muitas surpresas.

No todo, estudos em diferentes locais revelam que os micróbios do fundo do oceano são muito mais diversos do que se pensava há uma década.

Muito além de poucas espécies, os pesquisadores encontraram uma rica diversidade de bactérias, fungos, vírus e outros. “Ficamos chocados de serem tão complexos.

Pensávamos que iam ter umas 15 espécies, mas há uma diversidade enorme”, afirma a microbióloga Jennifer Biddle.

Ao comparar os micróbios de diferentes locais suboceânicos, Biddle encontrou quantidades maiores de arqueas – organismos unicelulares com uma história evolutiva ainda mais antiga –, em alguns lugares, do que bactérias. Ela pensa que os arqueas prosperam melhor na matéria orgânica do solo oceânico.

Um novo projeto, chamado de Censo da Vida do Fundo, vai ajudar Biddle e outros cientistas a analisar e comparar os micróbios do oceano. O projeto pode levar até uma década; o objetivo é encontrar regras gerais – se é que elas existem – que expliquem onde e como os organismos se mantêm no fundo dos oceanos.

“Por enquanto você consegue ter uma ideia ao olhar para os pontos energéticos presentes embaixo da superfície”, afirma o líder do projeto, Rick Colwell. “Mas será que as rachaduras nos mais diversos ambientes subaquáticos contêm certos tipos de microrganismos?”.

Muitos dados ainda vão chegar. “Nós não estamos sofrendo de falta do que fazer”, afirma Orcutt. Edwards e sua equipe planejam voltar ao Lago Norte em abril, para recuperar os instrumentos.

Fisher vai para Juan de Fuca novamente no próximo verão, e já conhece outro ponto de estudo, na Costa Rica, onde a água flui milhares de vezes mais rápido do que em Juan de Fuca.

Um dia, as análises da biosfera do fundo talvez possam ajudar a NASA e outras agências espaciais em suas caças por vida no sistema solar, e então os intraterrestres vão ajudar os cientistas a encontrar os extraterrestres.

Um comentário:

Na Boca do Sapo disse...

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